De abandono






Poderia assistir você dormir, mas o cinema era mais perto do que a noite e a cama. Afinal vim ver você, não o filme. Descontar toda a minha raiva dessa sua habilidade descomunal de me fazer ciúme, preferindo chorar, sem ter mesmo outra escolha. Minha raiva da sua felicidade, de me ver triste e poder colher minhas lágrimas como alguém que plantou uma prova do meu amor, e agora: a saudade, até mesmo de ter raiva, porque eu acho que gosto de você, da forma que uma xícara transborda sopros, da forma que eu abro meus olhos cem vezes depois de cada abraço. Não tenho medo de não te achar porque sou pouco demais. Tenho medo, porque você é tanto...
Diálogos gritantes entre vizinhos. À esta gente não tão próxima, digo com um meio orgulho à curiosidade alheia que você agora me deixa, e não vai mais voltar.
-Ela vai pra Itália!!!
-De passeio?!?!
-Não, de abandono...!!!!
Eu prometi não dizer mais para onde você iria, "Vai embora e basta!", quero este nome distante, mais do que você vai estar de mim.
Quando liguei, não era sua voz: uma tentativa frustrada de me fazer acreditar que você recusava minha preocupação.
E você não cansa de colher minhas lágrimas, ou eu que não canso de alimentá-las, elas não param de crescer, pintaram em mim um pequeno sorriso para manter o controle, fingir que tudo vai, bem, mas não tanto. O que foi? Nada.
Você correndo atrás dos pombos formando uma nuvem com centenas deles, enquanto eu estragava sua brincadeira, insultando-os, vermes, ratos alados...e rindo, pelos cantos mais obscuros do meu riso mais mastigante. Sei que você poderia comê-lo. A imagem poderia até me encantar, você corria no sol, eu queria te abraçar, mas fazia perguntas frias, por puro medo. Medo de que aqueles beijos fossem os últimos.

Posted by Menina Radiguet Drubi | às 12/07/2010 11:48:00 PM | 1 comentários

Itália

Chegaram a uma conclusão: sou complexa. Metade das pessoas diz que isso é bom, muitas outras não dizem nada. Não entendem nada. Acho que nem você me entende, muitas vezes. Acho que as palavras esqueceram de como sair da minha boca pra te mostrar que eu te vejo, criança, tão pequena, e te cerco com meus braços e você não pode fazer nada, às vezes isso me faz mal, quando vejo nem sempre lhe faz bem. Eu faria de tudo para pôr um juízo nessa sua cabeça, cresça, cresça, mas caiba dentro de mim.


Passei a noite sonhando comigo: sem graça, des-graça, palavras e palavras, sempre as mesmas, parecia que eu as lia, mas não podia escrever, nem esquecer, e repetia pra acordar e te dizer. Não disse.


Meu sonho hoje era que a Itália, a Espanha, e todos os outros lugares do mundo que você pudesse ir, fossem aqui, então você não poderia ir pra longe de mim, você não iria a lugar algum.


Tentei te ligar muitas vezes, e por um instante tive medo de esquecer sua voz, trocada pela secretária eletrônica, que parecia estar tramando absurdos para que eu não pudesse te encontrar. Foi apenas um momento de exagero.


Você continua aqui, consegui falar com você, você atendeu. Pronto, nada mais pode dar errado. A ligação não foi tão curta, foi suficiente, desligo. Sinto saudades, algo tão repentino e inquietante, e ligo de novo, não foi tanto tempo assim, preciso falar com você (mais e mais). Nunca sei o quê, mas sempre falta alguma coisa, como um colar sem fechar, que pode cair a qualquer momento, enquanto corremos em volta de nós mesmas, arrumando um jeito, uma idéia, de conseguir agarrar, uma a outra, pela última vez, sem chances de saída, de fugir ainda que sem vontade de ir embora.


O que falta na verdade, é um pouco mais de mim, e só um pouco mais de você, algum lugar, sem telefones, sem colares, sem nada, sem Espanha, sem Itália.

Posted by Menina Radiguet Drubi | às 12/02/2010 06:35:00 PM | 0 comentários