Louça

Meu bem, não te chamo de "meu" de novo, porque não posso, você é seu, só seu. Não posso te chamar assim, porque quando chamo sempre dá problema, e acabo te colocando entre os muitos "meus", e veja que me preocupo com isso aqui de gente!
Fica bem, e com certeza melhor do que na minha mão, porque quando é meu, descuido e cai no chão, já era. Não tenho culpa se são todos de louça, e gostam de mim, porque não consigo deixá-los na sargeta da vida, sem sorriso e sem um pouco das minhas palavras. Mas o que adianta? Pego, cuido, escorrega, cai e quebra, pronto. É melhor não curar todo esse abando, e deixar que eles trinquem de tanto silêncio e solidão. É, da próxima vez nem toco .

Posted by Menina Radiguet Drubi | às 8/24/2011 12:27:00 PM | 3 comentários

Fome escarlate

Corre-corre, de coração em coração, olha, cheira, aperta, mordisca: aprecia e cospe. Arranha cada um, tira a pele, queima, derrete e sangra. Morde e enche a boca, deixando pingar as gotas sutis de amor escarlate, enquanto ainda há vontade nos beijos jovens e nos olhos fechados.
Declara o maior amor que consegue arrancar de dentro de si, convence, e rouba o que deseja que seja seu, só seu, para o resto da vida. Ainda que não queira mais, e deixe de lado, cada pedaço morto de um amor desperdiçado.
Sente mais fome, percorre e rasteja, pega depressa, antes que alguém veja. Abre, rasga, mais uma vez, porque realmente sente prazer em despedaçar cada coração como se fosse o último. Faz assim, mas não faz por mal, nunca quis por maldade. Com os dentes bondosos, ainda que manchados com a cor de tristeza, chora baixo, tenta explicar sua fome, incessável, mas não encontra vítima que entenda, gostaria de pedir desculpas, não gosta de comer com pressa, e mastigar com tanta força, porque machuca.
Um mal grave, bonito de início, mas tão fatal nos fins que tem... São coisas da idade, esperava que fossem. Crescia, e ria, ardendo de hora solidão, hora companhia, daqueles amores, amores, e amores, que devorava sem querer, por uma voracidade -involuntária- que crescia nas entranhas.
Mas é tão bonito... Por que machuca? A idade é grave, gravíssima, sem cura, sem preguiça, há sempre mais curiosidade de provar uma fruta mais vermelha, e tão viçosa quanto a cor picante das veias, que quase não suportam a rapidez do sangue que corre, em fuga, mas também a procura.

Posted by Menina Radiguet Drubi | às 8/19/2011 08:55:00 PM | 6 comentários

Dor(me)-de-cabeça-vazia...

Minhas ideias estão doendo. Três horas para ler e pensar é muito, não preciso do dobro, nem da metade. E para quê tenho o triplo e meio a mais do que preciso, eu não sei. Por isso que estas tantas horas de tortura, deixo passar sem atenção, prefiro ficar não pensando, em outras cem coisas que estão querendo passear pela cabeça, sem fazer barulho, e sem dar trabalho, e isto ainda não me faz tão preguiçosa.
   Medito sobre tudo que é desimportante para os grandes pensantes, que me beliscam, até o último pedacinho de mente que restava sem os germes das palavras difíceis. Os germes que cheiram a tudo que eu não quero saber, mesmo se for muito necessário.
   Eu vou ranger meus dentes, bem forte, bem alto, até doer. Eu vou passar duas horas pensando na quantidade de perdas-de-tempo que eu preciso infincar na minha cabeça. E se eu tiver tanta coragem quanto raiva, vou martelar cada palavra, furar minhas ideias puras, contaminá-las, serei um indivíduo de outras ideias, velhas, afogadas e sujas de limo, ideias de desconhecidos, que me torturam.
   Me desespero tanto! Penhasco, onde se esconde? Onde, onde? 
Dizem que no triângulo das bermudas tudo parece mais tranquilo: some chão, some eu, mundo some, some tu-do. Sinto muito, muito, ter que comer a cabeça do mundo e cuspir o que eu não gosto de saber. Eu não gosto. 
   Não... Queria rir, mas hoje não vai ser, perdi muito tempo reclamando, que queria parar de reclamar, e no fim, não ri. Já passou da meia-noite, e se eu quiser rir, não pode mais ser hoje, que acabou de virar ontem, assim: "há duas horas foi ontem". Tão fácil, tão rapidinho. Se por acaso me convir dar uma risada, terá de ser no hoje-hoje, o segundo.
   Hoje, que vai ser amanhã depois que eu acordar, da curta noite de duas horas de sono, a chuva vai fazer músicas dissonantes estranhas, enquanto eu estiver pensando no que dizer, depois que abraçar a minha menina. Ou pelo menos eu espero que a chuva cante, e que eu veja a menina.
   Ela vai segurar a chave pendurada no meu pescoço, como se fosse dela, vai abrir meu cérebro como se fosse um coração metafórico, e vai abraçar meus pensamentos doentes e cansados, como se eles fossem eu mesma. Eu não acho nada disso completamente fora do normal. Só vejo poesia demais, para a minha pouca menina. E menina demais, para as minhas poucas ideias: umas assim, e as utras viradas ao contrário. As ideias de medo do mundo, e as de amor peculiar, acompanhado por chuva. 
Menina: destranque, abra, carregue e cure. Eu estou doente de ideias hoje, depois que acordei do sono pouco e duro. Os dias andam tristes. Torne mais fácil, feche meus olhos, tranque as portas de mim. Me faça dormir mais.

Posted by Menina Radiguet Drubi | às 8/13/2011 02:30:00 AM | 4 comentários